Poder da mente: quem pensa em coisas legais os males e medos espanta?
Qual é a relação entre uma ressonância magnética de crânio e o medo de voar? Para quem ainda não ligou o nome à pessoa, esse exame é aquele no qual o paciente é colocado deitado e o corpo é inserido quase que completamente dentro de uma máquina, devendo ele ou ela permanecer imóvel por um certo período de tempo — que na minha última experiência foi de aproximadamente 30 minutos. E não pode se mexer! Acho que isso é o mais próximo de ser enterrado vivo dentro de um caixão que eu já estive. É bem claustrofóbico, e eu nem padeço deste mal no dia a dia. Agora em setembro eu fiz uma RM (como chamam no jargão médico) da cabeça e foi… ótimo!
Da ressonância ao avião
Sim, eu tomei um remedinho, aquele que eu tomo nos voos, conforme orientação de minha psiquiátrica, que disse que era OK ingerir a medicação antes da ressonância. Mas tomei uma dose menor que a que me foi receitada para voos. O motivo? Não é que o medo era menor. Mas fiquei com receio de dormir e acabar me mexendo e ter de recomeçar o procedimento do início. Então, para compensar, eu comecei a pensar em pessoas, coisas e situações que me fazem sorrir. Pensei no meu marido e familiares, em comidas, bebidas, lugares. Lembrei de situações já vividas ou outras que ainda sonho fazer. Não, não se trata de positividade tóxica (inclusive já fiz matéria sobre isso aqui no rivotravel). O lance, na minha concepção, foi tentar enganar o cérebro, ter uma distração, me imaginar longe dali, daquele tubo metálico — qualquer semelhança com uma definição rasa de um avião é mera coincidência.
E foi um tal de visualizar Rafa num campo florido (é engraçado, mas juro que fiz isso), acarajé recém retirado do tacho do azeite de dendê, uma cervejinha gelada no bar favorito aqui perto de casa. E aos poucos fui me acalmando. Claro que às vezes sentia o coração batendo mais rápido, as mãos suando. Nessas horas, ligava o modo turbo e pensava em viagens que já fiz, como Roma, Roma na primavera, Roma no outono, Roma no inverno (menos em Roma no verão pois ninguém merece tal martírio climático). Sonhar com novos destinos, lugares insólitos como Mongólia e Ruanda.
Será que isso funciona em uma viagem de avião? Tomar menos remédio e tentar segurar a onda com esse recurso? Em dezembro, vamos passar o Natal em Campinas, na casa de uma irmã minha, e depois uns dias em São Paulo. A volta, por motivo de passagem aérea mais barata, ficou para o fim de tarde do dia 31 de dezembro. Chegaremos em Salvador por volta das 18h. Ou seja, se eu desembarcar grogue de medicação será o mesmo que dar adeus a qualquer plano de festa com amigos. Será que encaro essa?
E se eu não tomar o remédio?
E se eu passar mal?
E se eu tomar só metade da dose?
E se mesmo tomando metade da dose eu chegue grogue em Salvador e não curta o réveillon?
E se eu deixar para pensar nisso no dia do voo?
São muitos “ses”, não é mesmo?
O poder da mente
Mas voltando ao tema desta matéria, será que quem pensa em coisas legais os males e medos espanta? Ou será que o assunto acaba resvalando na temida e indesejada “positividade tóxica”? Ou mentalizar fatos legais seria algo inócuo?
“A desfocalização é uma estratégia de mudança da atenção frente a qualquer estímulo. No caso de eventos ameaçadores, a manutenção da desfocalização só é possível quando anteriormente existe um trabalho prévio a respeito da natureza ameaçadora do evento em específico ou das próprias respostas de ansiedade”, afirma André Luiz Moreno, que é mestre em Psicologia, doutor em Saúde Mental, além de conselheiro e diretor-presidente do Conselho Regional de Psicologia (MG). Desfocalização é o conjunto de técnicas para reduzir a atenção em um problema específico, pensamento ou sentimento doloroso, permitindo uma perspectiva mais ampla e a organização dos pensamentos.
Pensar em coisas boias para controlar a ansiedade nem sempre cai na temida “positividade tóxica”
Ele frisa a importância de um psicólogo no combate ao medo de voar. “Todo manejo (do quadro) deve estar apoiado em intervenções sólidas anteriores, que auxiliam a pessoa de maneira geral a lidar com a forma como ela vê o perigo, desenvolvem habilidades efetivas de enfrentamento para a ansiedade e para a situação que a desencadeia e expõe progressivamente o indivíduo à ansiedade visando a habituação e ganho de confiança”, afirma.
E será que a nossa mente é capaz de alguma forma de "acalmar os ânimos e o próprio corpo" em estado de ansiedade extrema, como baixar batimentos cardíacos acelerados, acabar com mãos suadas e outros sintomas da aerofobia? “A mente não é uma entidade externa ao corpo do indivíduo. Corpo e mente compartilham da mesma natureza física e se influenciam mutuamente. Nesse sentido, é possível sim que essa influência modifique sintomas fisiológicos”, diz o especialista.
É como eu sempre digo aqui no rivotravel: ajuda psicológica (e quando necessário psiquiátrica) é fundamental.